Trago mais uma história a parte, uma história curta e simples.
Espero que goste, boa leitura.
Um sonho estranho
Todo
dia eu pego o metro no mesmo horário e todo dia eu a vejo. Cabelos lisos até os
ombros, um rosto delicado, mas com um olhar de mistério e para completar ela
era baixinha e de corpo esbelto. Geralmente está vestindo uma saia azul marinho
e uma camisa polo branca com uma gravata vermelha, um all star preto e branco com meias brancas que chegavam até suas
coxas, se vestia igual a uma daquelas colegiais de filmes americanos. Carregava
nas costas uma mochila pequena e nas mãos, um fichário com um desenho que não
me era estranho.
Sempre
me peguei pensando em como me aproximar dela, mas minha timidez não ajuda,
também não sou criativo e muito menos acontece algo que eu possa utilizar para
iniciar uma conversa com ela, até aquele dia.
Era
mais um dia normal, peguei o metro e, como era de se esperar, ela estava a
bordo também. Por coincidência, consegui um lugar para sentar próximo a ela.
Sentei-me e fechei os olhos, mas tive a sensação que alguém me observava. Abri
um dos olhos e não percebi ninguém me olhando, voltei a fecha-lo. De vez em
quando eu abria um olho para ver se a garota ainda estava por perto, e para a
minha felicidade, ela estava.
O
metrô seguiu seu caminho rotineiro, mas houve alguns solavancos fortes, o que
deixou os passageiros preocupados. O silêncio imperava no vagão, quebrado
apenas pelo som das rodas do trem passando pelos trilhos, quando a voz do
maquinista soou pela caixa de som “Este
trem prestará serviço apenas até a próxima estação, por favor desembarquem.”.
“Mas que droga”, pensei, “justo hoje que eu não posso me atrasar o
trem dá problema”.
O
trem parou na estação seguinte como o condutor havia falado, todos os
passageiros desceram e ficaram parados perto do trem, eu consegui abrir
passagem pela muralha de pessoas que se formou em frente a porta e fui para o
mais longe possível da multidão. Fiquei refletindo sobre minha sorte até que alguém
me deu tapinhas no meu ombro. Ao me virar, tive uma bela surpresa, a garota que
sempre pega o trem comigo estava querendo falar comigo, ou talvez ela só queria
passar pois eu estava meio que no meio do caminho.
-
Com licença, nós pegamos o mesmo trem todos os dias, não? – Perguntou a garota.
-
Ãn, nós... é... hum... aham... – Grunhi. Excelente primeira impressão que
passei, né.
A
garota sorri gentilmente e então faz sinal para segui-la. Estranhei o que
estava acontecendo, tanto que me belisquei e doeu bastante, não era um sonho. Saímos
da plataforma de embarque e fomos até um canto onde havia uma porta com uma
placa, nela estava escrito “Apenas funcionários”. A garota simplesmente a abriu
e entrou, antes que a porta se fechasse, eu a segui.
A
porta dava em um longo corredor de aparência velha e abandonada, mal iluminado
por lâmpadas fracas de cor alaranjada. Continuamos andando pelo corredor até
chegar a uma outra porta, dessa vez ela era de madeira e bem velha, rangia só
de tocar nela, a garota me esperava perto da porta.
Ao
me aproximar, perguntei:
- Para
onde você está me levando? É algum caminho utilizado apenas pelos funcionários
para chegar na próxima estação?
Novamente
ela apenas sorri, abre a porta e passa por ela, me deixando no vácuo.
Hesitante, a segui. O lugar estava totalmente escuro, não dava para enxergar nem
um palmo em frente ao nariz, a única iluminação vinha do corredor que acabamos
de sair e, como se a luz machucasse, alguém bateu a porta de madeira com força,
me deixado na escuridão total.
Fiquei
alguns instantes parado, de olhos fechados, tentando escutar qualquer coisa que
pudesse me ajudar a me orientar. Resolvi andar de costas até a porta, tomando o
cuidado para não cair e perder a direção certa. Cheguei até a porta, tentei
girar a maçaneta, mas ela havia emperrado, forcei um pouco e ela quebrou.
-
Sério? – Perguntei indignado para a porta. – Eu nem usei tanta força assim.
Ficando
de costas para a porta enquanto pensava em como iluminar o local, me lembro que
possuo um celular e o mesmo tem luz de flash, pego o aparelho e ligo a luz.
Aparentemente não era meu dia, meu celular estava sem bateria. Respirei fundo
para tentar controlar meus batimentos cardíacos que estavam ficando cada vez
mais rápidos.
-
Tem alguém aí? Jovem, onde você está? Onde estamos? – Perguntei alto na
esperança que a garota me respondesse.
Silêncio.
Esperei mais alguns segundos antes de fazer qualquer coisa e então as luzes se
ascenderam. Foi tão súbito que fiquei cego momentaneamente, meus olhos
demoraram um pouco para me acostumar com a luz, mas quando comecei a me
acostumar, vi algo surpreendente.
O
lugar era um retângulo gigantesco, pelas mesas, equipamentos e cor, o local parecia
uma instalação militar abandonada, cheio de baias com documentos velhos, vários
outros corredores, duas escadas que levavam para o piso superior e vários
buracos nas paredes, a maioria do tamanho de balas, outros causados pelo tempo.
No piso
de cima, a garota me olhava de um jeito travesso, como se estivesse dizendo “está
com você, venha me pegar”. Assim que trocamos olhares, ela se virou e saiu
correndo por um dos corredores, subi e fui em sua direção. O andar de cima não
era muito diferente do andar em que eu estava, cheio de corredores abandonados
com escombros, buracos nas paredes e algumas grades de metal com portas, celas
talvez?
Confesso
que achei isso muito estranho, e arrepiante, mas fiquei mais curioso para saber
o que ela estava aprontando então resolvi andar pelo lugar, procurar a garota.
Entrei por um corredor e segui até o final quando ouvi um grito, corri para o
lado em que me pareceu vir o grito e pude ver de relance a garota ser arrastada
para dentro de uma sala. Corri até ela, mas a porta se fechou na minha cara e
eu não conseguia mais abri-la.
Chutei
a porta algumas vezes, tentei investir de ombros, mas a porta não cedeu.
Comecei a procurar outro caminho, abri todas as portas daquele corredor para
ver se alguma delas se encontrava com aquela que a garota foi arrastada, não
tive sorte.
Me
encostei em uma parede para descansar e ela cedeu com meu peso, acho que eu
devia fazer uma dieta. Por sorte o buraco deu no corredor que eu precisava
então me levantei logo e corri a procura da garota.
A
cada corredor que eu percorria, eu parava por um instante para saber para qual
lado correr ou qual porta entrar, me guiando pelo barulho que a garota fazia
enquanto era arrastada. Após dez minutos desse “pega-pega”, finalmente o
barulho ficou parado em uma sala, antes de entrar nela tentei ouvir algum som
de dentro, alguém andando talvez, mas nada então entrei e me deparei com um
corpo no chão.
Me
aproximei do corpo lentamente, percebi que não era a garota pelas botas que a
pessoa usava. Quando cheguei perto, para a minha surpresa, era um homem, ele
vestia uma farda de exército branca, suas botas eram de um cinza claro e ele
sangrava na altura do abdômen.
Ele
não reagiu quando me aproximei, mesmo assim verifiquei seu pulso, ele estava
morto. Quem será que havia matado esse homem? Seja o que tenha feito isso,
salvou a garota, mas... onde ela está? Me levantei e comecei a olhar em volta à
procura de algum sinal dela, pois o que quer que tenha feito aquilo com o
soldado, podia muito bem estar com a garota agora.
Quando olhei
para trás, vi a garota de pé no canto da sala. Ela estava de cabeça baixa e sua
roupa estava suja de sangue, em suas mãos algo brilhava e a ponta estava
vermelha, aquilo era uma faca?
A última
coisa que me lembro foi de ver seu rosto, duas luas minguantes formavam seus
olhos, sua boca era aberta como um sorriso, através de seus olhos e boca,
apenas a escuridão era vista. Ela avançou contra mim e eu senti algo quente em
meu estomago.
Então
acordei. Eu ainda estava no metro, não houve parada obrigatória nem nada. Olhei
em volta para ver se não estavam me olhando então eu a vi de relance, a garota
com aquele rosto assustador. Fechei os olhos e abri novamente e ela estava com
o rosto normal, ela me encarava intensamente. Será que ela sabe com o que
sonhei?
Fim
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