sexta-feira, 15 de abril de 2016

TEMPO DE VIDA

O que você faria se pudesse ver quanto tempo de vida uma pessoa teria? Soubesse a hora exata em que alguém morreria? Tentaria salvar as pessoas, mesmo que muitos dos casos sejam invitáveis? Ou tentaria se livrar dessa habilidade, ou maldição?

Leia a história TEMPO DE VIDA e reflita.

Boa leitura.


TEMPO DE VIDA

Chato. Esse foi o primeiro pensamento que tive no dia, logo após acordar. Me levantei da cama, tomei uma ducha rápida, comi uma torrada, me troquei e sai de casa para ir trabalhar. O dia estava limpo, sem nuvens no céu e o vento estava suave como uma brisa, o que deixou a temperatura muito agradável.
Lá estava eu, indo trabalhar a pé, pois minha situação financeira estava complicada e tinha que economizar, então aquilo aconteceu. Recebi uma ligação do escritório, eles estavam cobrando alguns documentos que já foram entregues no dia anterior e estavam muito bravos, eles não me escutavam enquanto eu tentava dizer que os documentos estavam na mesa da coordenadora do setor financeiro, o que começou a me deixar irritado e eu estava prestes a soltar alguns palavrões para ver se eles me ouvissem quando fui empurrado com força para a frente.
Joguei o celular para o lado e coloquei minhas mãos na frente para evitar que eu batesse a cabeça no chão e meus joelhos amorteceram o resto da queda, pouco segundos depois ouvi um som ensurdecedor de algo batendo com força no chão.
Olhei para trás e no lugar onde eu estava a poucos segundos havia um gigantesco piano preto destruído. Muitos curiosos começaram a se juntar ao redor, a tirar fotos e telefonar para a polícia ou para lá quem seja. Me levantei e comecei a procurar quem havia me empurrado, todos os rostos estavam focados no piano destruído, mas uma pessoa me chamou a atenção, era uma pessoa com o cabelo todo desgrenhado, suas roupas estavam sujas e rasgadas e ele era muito magro, um mendigo?
Tentei correr atrás dele, mas a multidão me impedia de chegar até ele, até mesmo de sair daquele círculo então subitamente números começaram a surgir em minha vista, números aleatórios de vários dígitos e sempre mudando.
Preciso sair daqui, e rápido. Pensei e logo em seguida comecei a forçar caminho entre a multidão e os números. A primeira coisa que aprendi sobre esses números era que eles eram intangíveis, pois tentei afastar alguns do caminho e minha mão passou direto por eles, como se fossem hologramas.
Andei de forma rápida para longe da multidão, tentando alcançar o mendigo que me salvou, mas ele era rápido e logo o perdi de vista. Olhei ao redor e vi os números aleatórios em cima da cabeça de várias pessoas, quando percebi que eles não eram tão aleatórios assim, cada pessoa possuía um conjunto de números em cima de sua cabeça, e esses números iam diminuindo, provavelmente a cada segundo que se passava, o número diminuía.
Do outro lado da rua, vi um senhor de idade andando com dificuldades e os números acima de sua cabeça estava perto dos trinta, fiquei observando o velho enquanto ele andava e os números diminuíam, dez, nove, oito, sete. Ele vai morrer?, pensei. Três, dois, um, zero. Então o velho fez uma careta e soltou um grunhido, colocou sua mão direita em cima do peito esquerdo e o apertou, como se tentasse apertar o próprio coração, ele se ajoelhou e então caiu de lado, sem vida, as pessoas ao seu redor correram para ajudar, mas já era tarde.
Os números significavam o tempo de vida das pessoas, supus. Olhei para meu reflexo em uma vitrine próxima e me surpreendi com o que vi, digo, com o que eu não vi, não havia números em cima de minha cabeça, o que isso significa? Como eu ganhei essa habilidade? Ou será que isso é uma maldição? Acordei hoje sem ver isso, e quando notei que eu conseguia ver esses números... foi logo após me salvarem! Foi o mendigo que me deu essa habilidade, ou jogou essa maldição em mim, mas ele sumiu.
Comecei a correr a procura do mendigo, mas não o encontrei em lugar algum. Passei por um hospital e vi alguns números com menos de três dígitos, o que não me parecia ser algo bom, mas como era em um hospital, provavelmente era inevitável.
Voltei para casa e me joguei no sofá. Fiquei olhando para o teto por um tempo então me sentei inclinado para a frente e apoiando meus braços nos joelhos e minha cabeça em minhas mãos, pensativo. Liguei a televisão e o noticiário da manhã já estava informando sobre o piano que quase me matou, vi o tempo de vida das pessoas através da tela da televisão, inclusive do apresentador do jornal.
Saber quando uma pessoa irá morrer, ninguém acreditaria em mim. Pensei em diversos casos que eu veria uma pessoa, saberia quanto tempo de vida lhe restava e não pudesse fazer nada para mudar isso, e isso começou a me deixar maluco. Eu tinha que me livrar disso logo, mas como? Provavelmente terá que ser da mesma forma que foi me passado, salvando a vida de alguém. É isso! Preciso salvar a vida de alguém, mas vai ser difícil.
Após tomar minha decisão, me levantei do sofá e sai de casa novamente, determinado. Andei sem rumo pela cidade até chegar a uma praça e para meu azar, e sorte dos outros, não encontrei ninguém que estava para morrer. Comecei a ficar desesperado, imaginando ver o tempo restante de minha família, de gente próxima a mim, chegando a zero e eu não ter forças para fazer algo para impedir isso.
Saí da praça e olhei para o céu, que estava ficando alaranjado escuro, estava anoitecendo. Parei em uma faixa de pedestre onde o sinal estava vermelho e senti a necessidade de olhar para mais adiante de onde eu estava, do outro lado da rua, quando vi uma garota se aproximando correndo, ela aparentava ter não mais que dezesseis anos, mas seu tempo de vida estava em vinte e descendo cada vez mais, olhei para os dois lados da rua e vi um caminhão seguindo em alta velocidade então as peças se encaixaram, a menina iria ser atropelada pelo caminhão e morreria na hora.
Sem pensar muito, corri em direção a garota, que tinha começado a atravessar a rua e parou na hora que viu o caminhão chegando, então saltei e por pouco também não fui atropelado, consegui salvar a garota, agarrando-a e caindo na calçada. As pessoas viram a cena e começaram a se juntar, enquanto eu me levantei e sai correndo, a menina finalmente saiu do estado de choque e olhou ao redor, procurando algo ou alguém, nossos olhos se cruzaram quando me virei para verificar se ela estava bem, ela se levantou e tentou me seguir, mas a multidão impediu ela e então eu sumi de sua vista, assim como os números sumiram da minha.

FIM.

Nenhum comentário:

Postar um comentário