Uma história perdida em meus arquivos. Apreciem.
Sem título.
Todo dia, quando olho pela janela da minha
sala eu o vejo. Um garoto, talvez não
muito mais velho que eu, 17 anos? Seu rosto era bem definido, seus olhos
castanhos claros davam um ar de mistério.
Seus cabelos eram pretos e curtos, o suficiente para fazer um topetinho, nada
muito espalhafantoso. Ele usava óculos
grandes de aroa pretos, o que dava uma aparencia mais culta.
Sempre vestindo peças de roupas um pouco fora de moda, uma camisa branca de mangas
cumprudas, uma gravatinha vermelha xadrez, uma calça social marrom que combinava com seus sapatos também marrons.
Estava sentado no banco em frente a praça. Essa praça era grande, do tamanho de um quarteirão inteiro. Pessoas passavam por ele, todos os dias. Nunca o vi
conversando com alguém, mas sempre fico atraída por ele.
A tarde de hoje era quente e abafada, o ceu
estava preto apesar de ser 17 horas ainda. Resolvi passear um pouco, pois em
casa o calor era insuportável.
Me arrumei, prendi meus cabelos castanhos e
lisos num rabo de cavalo com fita vermelha, coloquei um vestido de peça única
que ia até metade da minha coxa,
por baixo coloquei um shorts jeans curto. Um All Star para combinar não me mataria.
Sai de casa e fui direto para o parque,
claro que não fui de encontro com
aquele rapaz, seria muito óbvio. Dei umas voltas e
passei duas vezes na sua frente. Juro que da segunda vez ele me acompanhou com
o olhar, como estou podendo!
Voltei uma terceira vez, dessa vez fiz uma
cara de perdida
-Com licença, para que lado fica a Av. Torta de Limão?
-Fica para o lado que você foi duas vezes, jovem. -o garoto respondeu com
um leve sorriso. Ai meu Deus, que sorriso lindo.
-Obrigada. -olhei para ele meio
desconcertada e aparentemente vermelha pois ele perguntou:
-Você está bem? Me parece perdida.
Sente-se aqui e eu lhe ensinarei o caminho correto e mais curto.
Ok, isso me pegou de surpresa, quem em sã consciência ajudaria tanto um estranho? Ainda mais um que passa três vezes na sua frente e fica completamente
vermelho. Resolvi aceitar sua gentileza e me sentei o mais longe dele. O que não adiantou muito pois ele se aproximou.
-Veja, se você for para esse lado, chegará
na rua Beijinho em poucos passos, já
daquele lado você irá dar de cara com um beco sem saída.
-E aquele lado ali me levará para a rua Torta de Morango.
-É,
é isso mesmo. Como você... Ah, verdade.
-O que é verdade?
-Nada não. -ele deu uma risadinha de
gozação. Definitivamente
estava gozando de mim.
-O que é tão engraçado para você rir?
-Nada, eu só apenas percebi quem é
você.
-E quem sou eu?
-A garota que mora naquela casa logo do
outro lado da rua. Vejo você quase todo dia na
janela. Devia ter mais cuidado eim.
-Ah, então você estava tirando sarro de
mim quando eu me finji de perdida?
-Na verdade, não. Eu não tinha percebido que era
você, pois você está
muito linda. Mais que o normal.
O que há com esse cara? Dando em cima de mim como se fosse a coisa mais
simples do mundo! Vou te dizer uma coisa... ele está me conquistando.
-Oras, você sai elogiando toda garota que encontra é? Um galinha.
Ele soltou uma gargalhada divertida,
descontraída. -Não,
dificilmente elogio alguém, ainda mais uma
estranha. Mas você mereceu esse elogio.
-Ah cala a boca, mentiroso.
Ele deve ter percebido que eu realmente
gostei do elogio pois logo continuou.
-É
errado dizer a verdade a uma bela dama como você?
-Hunf -dei as costas e fui em direção a minha casa.
-Ei, volte mais vezes para podermos
conversar.
-Só
em seus sonhos. -posso ter soado rude mas acredite, eu estava sorrindo e feliz
pelo convite.
Os dias se passaram e eu fingia me
encontrar com ele por acaso. Ficavamos horas e horas conversando. Não sei como ele me aguentou todo esse tempo.
Já
se passou 2 meses desde que começamos
a conversar e eu não mais tenho dúvida, eu o amo. Resolvi me declarar para ele
hoje então fui o mais arrumada
possível. Igual ao primeiro
"encontro".
Olhei pela janela e lá estava ele, sentado no mesmo banco. Sai de
casa e fui me encontrar com ele.
-Veja só quem está de passagem novamente.
Boa tarde bela dama.
-Não
venha puxar meu saco, jovem rapaz. Hoje tenho algo a te falar e exijo que me ouça.
-Claro, pode falar.
-Eu gosto de você e quero que seja meu namorado e não aceito um "não" como resposta
Pensei que seu rosro se iluminaria com meu
pedido nada egoista mas me enganei. Sua expressão era de pura tristeza. Nunca
o tinha visto assim, mesmo nos dias ruins. Realmente fiquei preocupada.
-O que houve? Isso não lhe agrada? Ser meu namorado não é
bom o bastante para você?
-Não,
não é
isso. Estou realmente feliz por isso estar acontecendo mas... -sua voz falhou e
então ele virou o rosto.
-Mas o que, criatura? Diga logo. -tentei
soar o mais irritada possível mas a verdade era que
eu estava com medo da resposta.
-A verdade é que não podemos ficar juntos.
-ele me olhou sério quando falou.
-E por que não podemos ficar juntos? Quem está nos impedindo? Fale-me que eu darei um jeito.
-Aprecio o entusiasmo mas mesmo que eu
fale, de nada adiantará.
-Como sabe que de nada adiantará se nem tentamos? Como pode ter certeza disso?
-falei quase gritando. Como ele ousa desistir tão facilmente?
-Porque vivemos em mundos diferentes.
O choque produzido por tais palavras me
deixou muda. Não sabia o que dizer, o
que pensar.
-O... o que você... o que você quer dizer com isso?
-Escute com muita atenção. Quero que você mantenha a calma e me escute. Você não pertence a esse mundo,
está morta.
-Ha! Que piada ridícula! Como se atreve a dizer
que estou morta? Que prova você tem em relação a isso?
-Eu sou um esper, consigo ver pessoas
mortas, como você.
-Isso não é prova alguma. Se é assim, então eu sou uma fada!
-Então me diga, o que você fez hoje de manhã?
-Horas, eu fiz... eu... eu... eu não lembro... Mas é normal isso, não lembrar. Sempre
esquecemos coisas fúteis.
-Que dia é hoje então?
-28 de maio.
-Ano?
-1856.
Ele apenas balançou a cabeça negativamente e então estendeu um jornal, a data mostrava ser 28 de
maio, como eu havia dito porém... 2025. Isso é impossível, não se passaram nem 3 meses
desde que... desde quando eu estou nessa rotina? De ir até a janela e ficar olhando as pessoas? Não consigo me lembrar do que eu faço todas as manhãs. Não consigo nem lembrar que
eu acordei ou fui dormir. O que está
acontecendo comigo? Isso é alguma droga que ele
usou em mim sem eu perceber?
Coloquei minhas mãos na cabeça em sinal de desespero
mas percebi que eu não tinha mais mãos, elas haviam sumido. Comecei a gritar em
desespero, estava ficando louca!
Um abraço, alguém me abraçou antes que eu surtasse. Um abraço aconchegante, caloroso. Isso me acalmou, me
salvou.
Olhei para quem me abraçou, era o jovem rapaz que eu amava.
-Calma, estou aqui contigo. Não se desespere. Vai ficar tudo bem.
Percebi que fiquei mais calma, minhas mãos voltaram a aparecer.
Passaram-se alguns minutos e então consegui raciocinar.
-A quanto tempo estou morta?
-210 anos.
-Nossa, já faz muito tempo... Como não
percebi o tempo passar?
-Fantasmas tem uma percepção diferente do tempo.
-Quem é você?
-Eu já disse, sou um espero que consegue ver fantasmas. Estou aqui para
ajuda-la a seguir em frente.
-Mas eu não quero seguir em frente, quero ficar com você.
-Isso não será possível, vivos e mortos não devem se misturar. Mas se você realmente quiser ficar comigo, me espere. Quando eu morrer, com
certeza irei te procurar. Mesmo que eu demore, me espere, confie em mim.
-Eu confio e esperarei.
E com um último abraço e um primeiro beijo, me
despeço daquele jovem que me
fez companhia por tanto tempo, que me aturou até agora.
Te amo.
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